lo malo de ser bueno

“A verdade é que não há uma verdade.” A minha música favorita da banda uruguaia El Cuarteto de Nos começa com a frase que ele canta logo em seguida ter lido na parede da cidade e não saber se foi sorte ou acaso que ele a tenha lido, porque agora estaria inquieto por estar a mercê dessa loucura cheia de dualidades que é a vida. Falo sobre cada frase do primeiro parágrafo da música, porque o fato dela ser de 2012 permite que falemos sobre uma parede da cidade e sobre sorte ao invés de reels e algoritmo como é impossível não se falar hoje em dia e a casualidade se torna cada vez mais contestável.

Recentemente decidi excluir minhas redes, porque infelizmente é impossível para nós meros mortais assalariados nos enfiarmos em um buraco por 3 ou 36 meses, então o mais perto que podemos fazer disso é nos desligarmos do mundo digital o máximo possível. E ”lo malo de ser bueno” me apareceu como um bom ponto de partida pra escrever uma despedida, minha música favorita da minha — muito possivelmente — banda favorita, banda que foi tema a minha última sessão de terapia e que ressurgiu com muita força no meu dia-a-dia este ano. Não que eu não a ouvisse há séculos, mas el cuarteto de nos sempre some nos meus mais ouvidos e reaparece, some como todo o resto e reaparece mais que qualquer um.

Acho que desde a primeira vez que ouvi essa música, ela me pegou. Muito pela frase “graças a deus sou ateu”, que relendo meus últimos meses percebo que abracei como um mantra, mesmo sem ouvir a banda por muitos anos, minha frase mais dita era “deus é bom o tempo todo” e na minha descrença no divino sempre tive certeza de acreditar com mais fé do que a grande maioria dos crentes. ”Como aguentar tanta ambiguidade, não é mesmo? Esta vida vai me matar, meu coração vazio não aguenta uma ausência mais”. E pego o refrão emprestado pra falar as exatas palavras que queria usar pra explicar a minha questão com o divino, mas não é por causa de Deus que trago essa música hoje. É por causa de mim.

Reels e algoritmo. Não os comparei à toa com paredes e sorte. Uso os reels pra ilustrar, mas podem ser shorts, tiktoks, páginas de notícias no google, qualquer coisa. Não repudio a forma de conteúdo e nem sou o sétimo trompetista do apocalipse falando que a nova geração está perdida por consumir conteúdo rápido, não é o ponto aqui. O ponto é que estou completamente perdide de mim e isso costumava ser bom, esse caos absoluto, ser um remendo infinito de possibilidades, porém agora não está sendo. Porque está muito complicado encontrar qualquer coisa pra chamar de eu no meio dessa massaroca digital que me consome mais que por mim é consumida. Decidi me afastar porque amo consumir vários conteúdos esquisitos e contrastantes entre si e não consigo mais consumir, …

Mas sei que não vou conseguir sair do lugar sozinhe, por isso desenvolvi mó esquema de dados pra jogar minhas decisões pra aleatoriedade. Não vou explicar, só deixar rolar (literalmente) e falo disso só porque já fiz os sorteios dos 8 livros que tenho que focar nas próximas semanas e graças a deus “a insustentável leveza do ser” está entre os sorteados. A leitura mais el cuarteto de nos que existe? Talvez, a mais lo malo de ser bueno? Com certeza. E é engraçado como essa coincidência não é algoritmica, sabe? Passei os últimos meses pensando se eu gostava mesmo das coisas que me apareciam nas redes ou se era só o algoritmo me ensinando a gostar de algo novo e agora eu joguei dois D20 e os multiplique, dos 152 possíveis resultados diferentes, eles me indicaram…

Continuarei dizendo sim querendo dizer não, continuarei dizendo não querendo dizer sim; e sempre terei a ciência que até as minhas fraquezas são mais fortes que eu. Mas quero me tornar minha própria ambiguidade, quero me perder em mim ao encontrar um eu e encontrar minha perdição. Não quero mais um algoritmo com meus dados de consumo me educando sobre o que eu gosto, os únicos dados que eu quero são os que rolarão pra decidir quais exercícios farei, quais livros lerei e quais histórias escreverei. E nessa aleatoriedade brutal, talvez eu encontre a linha do tempo do mal, talvez eu viva na melhor delas; mas nenhuma dessas linhas do tempo serão escolhidas por um robô, tudo será analógico, amém.

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